terça-feira, 18 de outubro de 2011

Ciência na cozinha

Fujo um pouco a proposta do "Sabor e Histórias",mas trago nesta postagem uma matéria que achei interessante.Bom apetite! quer dizer,boa leitura!

Ciência na cozinha faz gelatina quente e sopa crocante

Gelatina quente, sopa de peixe em bolinhas crocantes ou gelado que solta fumo são algumas das criações culinárias que resultam da união entre cientistas e chefes de cozinha, um fenómeno crescente que dá os primeiros passos em Portugal. A gastronomia molecular é um ramo da ciência dos alimentos nascido há mais de 20 anos e que se centra nos fenômenos físicos e químicos que ocorrem quando se está a cozinhar.

Os conhecimentos produzidos por esta ciência começaram entretanto a ser utilizados por alguns chefes de cozinha, dando origem a um novo tipo de culinária "fantástica" que tem cada vez mais adeptos na Europa, explicou à Agência Lusa Margarida Guerreiro, investigadora nesta área.

"A gastronomia molecular tem a ver com a compreensão do que ocorre com os alimentos quando se cozinha" e a partir daí encontrar as respostas para questões do dia-a-dia como qual a temperatura a que a carne deve ser exposta para ficar macia e suculenta, como conseguir um soufflé bem apurado ou umas volumosas claras em castelo.

"É que no fundo cozinhar é fazer química e a cozinha é um laboratório que todos temos nas nossas casas", explicou aquela investigadora do departamento de Botânica e Engenharia Biológica do Instituto Superior de Agronomia (ISA). Ou seja, quando se aquece os alimentos (ao lume por exemplo) actua-se ao nível das moléculas, aumentando a sua velocidade e obrigando-as a colidir umas com as outras.


Alteração da estrutura molecular

Estes choques alteram a estrutura molecular, criando novas moléculas e mudando a cor, o sabor e a textura dos alimentos, explicou Margarida Guerreiro, acrescentando que a gastronomia molecular ensina a descobrir os porquês dos truques culinários.

Foi precisamente por isso que alguns dos melhores chefes de cozinha se começaram a interessar por este ramo da ciência e por uma série de equipamentos usados nos laboratórios de investigação, como agitadores magnéticos, medidores de PH e aparelhos que permitem fazer um banho-maria exactamente à temperatura que se quer. Além disso, a par dos ingredientes tradicionais, os novos chefes de cozinha começam a usar aditivos alimentares, inofensivos para a saúde, como os alginatos, o agar-agar ou o azoto líquido.

O agar-agar é um espessante extraído de algas marinhas e que permite fazer "uma óptima gelatina, mas quente", da mesma forma que o azoto liquido (usado em laboratório para congelação imediata) é agora utilizado nalguns restaurantes para fazer "espumas espectaculares" ou gelados do sabor que o cliente quiser, no momento e à sua vista. A investigadora adianta que esta forma de confeccionar um gelado é "muito espectacular porque deita uma grande fumarada".

Um outro exemplo de aplicação dos conhecimentos da gastronomia molecular à cozinha foi um prato confeccionado por esta investigadora mais quatro colegas e com o qual ganharam este ano o primeiro prémio do I Encontro Ciências & Cozinha, que decorreu em Paris.

Bolinhas de sopa de peixe

Tratou-se de uma "sopa de peixe" constituída por umas bolinhas, que na boca se partiam e deixavam sair a sopa líquida, sobre algas com sabor a amêijoas à Bulhão Pato. Para o revestimento das bolinhas de sopa foi usado um alginato, produto extraído de algas que solidifica na presença de cálcio, e para fazer as algas foi usado o molho das amêijoas, com espinafres para dar a cor verde, e agar-agar para dar a forma e a consistência gelatinosa das algas.

Os conhecimentos científicos proporcionam assim novas técnicas culinárias, permitindo não só antever o comportamento dos alimentos, mas também conhecer as afinidades entre eles. Margarida Guerreiro contou, a propósito, como um chefe de cozinha achou certa vez que o chocolate branco ligava bem com o caviar e como, depois de feitas as devidas experiências, concluiu que do ponto de vista químico estes alimentos tinham muitas afinidades.

A união de contrários - sabores e texturas- é outra das experiências qu e estão a ser utilizadas por grandes chefes de cozinha e que têm tido resultados muito positivos. Um "morgado de figo com espuma de laranja" que a investigadora comeu no Algarve é um bom exemplo disso: come-se uma "coisa pesada e muito doce acompanh ada de outra extremamente leve e que desenjoa".

Para a investigadora, a união entre a ciência e a culinária é um casamento perfeito, pois da mesma forma que um músico criativo e com conhecimentos aprofundados de música pode compor obras magnificas, também um bom chefe de cozinha com criatividade e conhecimentos científicos sobre os alimentos pode criar pratos únicos, artísticos e saborosos.

Pratos mirabolantes

"Quando eu vou a um restaurante desses, não estou preocupada em matar a fome ou saber se o prato é nutritivo. Eu quero é ser surpreendida, ver um espectáculo, tal como quando vou a uma exposição ou a um cinema", disse. Estes pratos mirabolantes são já confeccionados em vários restaurantes de países com grande tradição gastronómica como França e Itália, mas também em E spanha, Inglaterra, Argentina e até em Portugal, onde este fenómeno começa a dar os seus primeiros passos.

Quinta do Catralves, Hotel da Lapa, ou 100 Maneiras são alguns dos restaurantes portugueses onde se pode provar as especialidades gastronómicas que juntam sinergias culinárias e científicas. Dos laboratórios para os restaurantes, e dos restaurantes para a universidade: este é o caminho traçado pelos novos chefes de culinária, tão ávidos de conhecer mais sobre gastronomia molecular que foram quase exclusivamente os únic os alunos presentes nas duas acções de formação promovidas pelo ISA.

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